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terça-feira, 6 de abril de 2010

É por essa e outras razões que sempre preferi os começos.

Mais uma manhã, dessas despretenciosas manhãs de calor. Meio atrasado ele corre para o banheiro, toma um banho rápido, faz um sanduiche de pão e manteiga, uma xícara de café preto, engole e vai para o ponto de ônibus. Chega na universidade, assiste a aulas intermináveis e não vê a hora de poder sentar e papear trivialidades cotidianas com os amigos.
Saíram às onze, sentaram num dos bancos que ficava sob a sombra majestosa de uma árvore centenária, exatamente de frente para a cantina quase vazia. Mas não totalmente. Depois de alguns minutos de conversa, ele é interrompido por um amigo com a seguinte pergunta:
- "Vê aquela Alma ali na cantina?"
- "Sim." Ele responde.
- "Ela está olhando para mim ou para você?" Pergunta o amigo.
Diante de tal indagação, ele permanece calado, apenas o olhar fixo em Alma. Ambos se olharam profundamente, era uma fração de segundos...segundos profundos de olhares eternos.
Ele viu quando Alma se foi, olhou para trás e discretamente desapareceu entre carros, pessoas e foi para qualquer lugar que ele ainda não sabia qual era.
Ele foi para casa pensando em tudo que tinha acontecido, tudo tão fugaz e simbólico ao mesmo tempo. Sabia que veria Alma novamente. Sabe aquela sensação inexplicável de se sentir feliz, de sentir o frio na barriga na hora que a montanha-russa cai no abismo da vida? Poís era essa, a única certeza que tinha, de se sentir assim.
Logo, ele procurou se aproximar das pessoas que estavam com Alma naquele dia e aos poucos foi se fazendo perceber, até o dia em que os conheceu. Procurou não ser invasivo e discreto para não levantar suspeitas ao saber algo sobre Alma, quando apareceria e outras coisas mais. Doce ilusão a dele, por que uma das amigas de Alma já havia percebido que sua aproximação não era algo desinteressado e muito menos desinteressante, mas continuaram.
Dias depois, ao chegar para mais uma jornada de aulas, viu Alma sentada em um banco próximo a cantina lendo um livro. Seus olhares se cruzaram, ele sentiu novamente o coração pulsar desesperadamente, mas como já estava de saída, continuou.
Foram apresentados dias depois, conversaram como se fossem dois grandes conhecidos, de outras vidas quem sabe! Falaram de música, filmes e todas aquelas outras coisas que falamos quando estamos interessados um no outro. Prometeu gravar-lhe uma fita cassete, com seu repertório particular, para que Alma pudesse conhecer novos sons. Mas principalmente, para que lembrasse dele ao ouvir cada uma daquelas canções.
Tomou a liberdade de pedir seu telefone, para que pudesse ligar e avisar quando a fita estivesse pronta. Marcaram numa tarde de sexta-feira, mais ou menos as quatro, cinco horas da tarde, quando o sol começava a fazer seu ritual de descida rumo a escuridão. Ele chegou mais cedo um pouco, ficou lendo um livro para poder enganar o tempo e a ansiedade. De longe viu Alma caminhando em sua direção, cumprimentaram-se educamente, sentiram as mãos suadas e a voz trêmula ao dizerem em harmoniosa sincronia "Oi, tudo bom?". Alma sentou-se e ele, por sua vez, entregou-lhe a fita gravada especialmente em sua homenagem.
Alma parecia levemente inquieta, perguntou se havia algo de errado e ela dissera que estava com problemas, coisas da vida, do calor, do caos, da incerteza do amanhã. Diante disso tudo, de todos os papos e desabafos, ele aproveitou para convidar Alma para sair naquela noite e se distrair um pouco. Ela pensou e logo concordou que não adiantava ficar sofrendo por coisas que não iríam se resolver naquele momento e nem no dia seguinte também.
Marcaram de se encontrar por volta das oito, nove horas da noite. Ele foi o primeiro a chegar, estava mais nervoso ainda, sentia mais uma vez aquela gostosa sensação de se sentir assim, na beira do abismo, prestes a cair rumo ao desconhecido universo de ser feliz. Alma não tardou a chegar e na hora marcada, o lugar se encheu de luz com sua presença. A beleza de Alma o envolvia a cada minuto que passavam juntos.
Encontraram os amigos dela e foram todos para o bar onde beberiam algo, ouviriam música ao vivo, conversariam amenidades, etc. Mas o que realmente importava para ele naquele momento era estar na presença de Alma.
A banda tinha começado a tocar e todos resolveram chegar mais perto para dançar um pouco, exceto ele e Alma. Preferiram ficar a mesa, conversando um no ouvido do outro, poís o som era alto demais para que pudessem compreender o que diziam a uma distância mínima. Alma falou um pouco de si, podia sentir seu cheiro, sua respiração. Ele falou de si, Alma podia sentir seu cheiro, sua respiração também. Certa hora, ele dissera que se sentia muito só e nesse momento, Alma posicionou lentamente sua boca bem pertinho do ouvido dele e disse: "Você não está mais só! Eu estou contigo!"
Ele tremeu, sentiu novamente a sensação de se sentir assim, era como se estivesse nascendo e precisasse respirar e viver tudo em segundos e amar e ser feliz....e logo tratou de agradecer a essa declaração com um caloroso abraço. Ficaram abraçados, sentiu Alma cheirar seu pescoço, fez o mesmo também. E com os rostos colados um no outro, foram beijando levemente a face um do outro, a boca de Alma vindo de encontro a boca dele e no segundo seguinte, se beijavam. Naquele momento, ele sentiu como se o lugar estivesse deserto, não via ninguém, não ouvia ninguém, além de Alma. O beijo de Alma tinha sede e o dele tinha vontade de sentir mais. Ficaram minutos assim, sendo apenas um!
Já era tarde da noite quando resolveram sair do bar, foram todos juntos para um dos bancos vazios respirar a brisa da manhã que se anunciava. Sentaram juntos e abraçados, ele e Alma.
Ele sabia que daquele momento em diante aquela Alma seria seu porto seguro, seu caís, seu lar. Os dias passavam e durante meses eles se amaram como se não houvesse outro amanhã. Se amaram muito, até o dia em que Alma se fora, queria ganhar asas, queria voar e descobrir o pote de ouro no final do arco-íris. Porém, é mais prudente deixar essa parte para uma outra hora. É bem mais interessante falar dos começos, eles são sempre melhores. Sempre dá aquela vontade de viver mais, de viver muito. Diferente dos meios, quando sentimos vontade de viver, apenas viver. Diferente dos fins, quando não dá vontade de viver de jeito nenhum...e é por essa e outras razões que eu sempre preferi os começos.

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